Só que, bem antes disso, as tribos e civilizações sul-americanas já faziam uso da pimenta: são conhecidos registros arqueológicos no Peru, datados de 1200 a.C., que se referem ao tipo malagueta. O célebre médico da Grécia antiga, Hipócrates, encontrava nela um poderoso princípio curativo. No auge do Império Romano, as regiões costeadas pelo Mar Mediterrâneo empregavam a pimenta como moeda de câmbio.Átila, o rei dos hunos, ganhou carroças cheias de pimenta - leia-se um valioso presente - para favorecer corruptos. E, mais recentemente, há dez anos, em pleno século XX, o príncipe Charles da Inglaterra, por ter sido nomeado Duque da Cornuália, recebeu como dote um maço de lenha, um par de esporas, um arco de caça, um casal de cães galgos e... meio quilo de pimenta.
A tradição pode ter se diluído como o passar do tempo, mas o valor real e simbólico da pimenta, ah sim, este permaneceu intacto. Prova disso é que ela está na moda há pelo menos mil anos, acumulando uma popularidade invejável desde que foi cultivada pela primeira vez. Em todo lugar onde chegou, tornou-se uma aquisição tão apreciada quanto o chocolate e o alho. De tanto poder de acentuar o paladar, ela tem gabarito para sustentar sozinha uma receita. Sem contar que é bonita, vistosa, tem personalidade!
Vamos conhecer um pouco mais sobre esta tentação que basta a gente pôr na boca para dar vontade de chorar - de satisfação, asseguram os fãs.
QUEIMA CALORIAS E PREVINE O CANCER
Quem diz quea pimenta faz mal para a saúde, com certeza desconhece os seus poderes. Em quase todos os tipos encontramos propriedades fabulosas. A começar pela descoberta de cientistas ingleses e japoneses: eles chegaram à conclusão de que, se incluíssemos um pedacinho desse fruto picante todos os dias em nossas refeições, o metabolismo geral do organismo seria estimulado de tal forma que seria possível queimar 25% a mais de calorias por dia. Mas, sem dúvida, a descoberta mais recente e animadora é que a capsaicina (substância encontrada na casca dos frutos) pode ter um efeito anticancerígeno. Pesquisadores da Universidade de Medicina da Califórnia, Estados Unidos, revelaram que a pimenta pode impedir o fígado de transformar hidrocarbonetos poliaromáticos (componentes encontrados nas carnes defumadas e grelhadas) e aflatoxinas (toxina encontrada em grãos e em seus produtos industrializados) em substâncias tóxicas que facilitam o desenvolvimento do câncer.
Os benefícios da capsaicina não param por aí: há quem diga que ela pode reduzir a dependência da nicotina. Também elimina aquela sensação de estômago pesado após as refeições, ajuda a dissolver as gorduras, reduz o nível de triglicérides e o colesterol no sangue. Ao mesmo tempo, estimula o fígado na secreção de enzimas a serem usadas durante o metabolismo da gordura, que acaba tendo sua absorção e depósitos reduzidos. Algumas pesquisas norte-americanas mostram ainda que esta substância também funciona como antibiótico, além de o seu extrato ser bastante eficiente em feridas, como cicatrizante e analgésico.
Outras vantagens de incluir pimenta na sua alimentação? Os frutos verdes são ricos em vitamina C; e os vermelhos secos tem tanta vitamina A que uma colher de chá de molho de pimenta vermelha é capaz de suprir as necessidades diárias deste nutriente no organismo. Além disso, são alimentos de baixa caloria (boa notícia para quem está de dieta) e laxativos naturais, pois agem sobre os nervos que estimulam o cólon. Porém, um aviso importante: apesar de todas as propriedades da pimenta, não se pode ingerí-la indiscriminadamente. Como tudo o que se come em exagero, pode fazer mal - dificultar a digestão, por exemplo. Por provocar efeitos laxativos, sua utilização é terminantemente proibida para pessoas que sofrem de colite ou hemorróidas. Se não sofre nem de um, nem de outro mal, aproveite. Você só tem a ganhar com este poderoso alimento.
A CONEXÃO PIMENTA-DOR
Pesquisas recentes mostraram que o condimento pode funcionar como um saudável analgésico natural. Acontece que a capsaicina estimula a liberação de compostos químicos que transmitem ao cérebro a ordem de parar a dor. Em resposta, outras células nervosas secretam endorfina, substância que o próprio corpo produz para suprimir a dor. Resultado: ela passa em cerca de 10 minutos.
O REFINADO RITUAL DA CONSERVA
É sempre estimulante usar e abusar da pimenta fresca, só que o figurino da necessidade e da tradição manda conservá-la em frascos. Os gourmets imploram que não seja lavada, já que o melhor (em termos de sabor e de nutrientes) da pimenta está na casca. Melhor limpá-la cuidadosamente com um pano seco, colocar uma porção dela num frasco de vidro transparente e cobrir com vinagre e sal. É também de bom gosto curtí-la na aguardente velha, como em Portugal; ou na cachaça jovem, seguindo à risca o que se faz aqui. Uísque é nobre e excelente companhia, assim como conhaque e outros destilados. Para deixar o frasco com um visual ainda mais bonito, acrescente folhas de louro, alguns dentes de alho e um punhado de pimenta-do-reino para enfeitar.
QUAL É O SEU TIPO?
No Brasil, possuímos inúmeras variedades de pimenta, inclusive algumas silvestres, que vão adquirindo nomes e apelidos de acordo comas diferentes regiões.
Pimenta do reino
A Piper Nigrum é uma planta trepadeira, perene, que produz grãos pequenos e redondos. Quando verdes, são cultivados em salmoura ou vinagre e depois usados para temperar carnes, principalmente o famoso Steak au Poivre. Em sua fase seguinte, o fruto amadurece adquirindo um coloração mais avermelhada. Os grãos são secados e ficam pretos e rugosos, com aroma e sabor mais acentuados - é quando estão no ponto para serem comercializados, levados à moagem ou destinados ao preparo da pimenta-do-reino do tipo branca. Nesse caso, os grãos maduros ficam de molho em água salgada até perderema sua camada externa e ficarem esbranquiçados. Este tipo de pimenta-do-reino combina com perfeição com peixes e aves por ser mais suave que a preta. A cinza também é muito comercializada e anda mais é do que uma mistura de grãos pretos e brancos.
Malagueta
De nome científico Capsicum Frutescens e originária do Caribe, é altamente empregada na culinária do Norte e do Nordeste do Brasil. Seus frutos são pequenos, alongados e de coloração avermelhada, alaranjada ou amarela. É a mais picante de todas as espécies cultivadas e, quanto menor, mais ardida. Em francês é chamada de piment-enragé e em inglês é conhecidacomo chili ou spur pepper. Vai bem com carnes, por exemplo.
Parenta da malagueta, a Capsicum Baccatum também tem forma cônica mas não ultrapassa o tamanho de um dedo indicador. Brilhante, sua pele vermelhaé fina e delicada, e seu sabor bem menos picante que o da malagueta - principalmente se lhe extraem as sementes. Estas, postas a secar,são vendidas com o nome de pimenta-calabresa. A dedo-de-moça também é conhecida por esfola-bainha e pimenta-dos-macacos.
Cumari
A Capsicum Praetenissum tem a forma ovalada e seu frutoé do tamanho de um grão de feijão. É encontrada desde bem verde, até alaranjada, quando chega ao auge de sua maturação. Apesar de quase tão forte quanto a malagueta - não é raro fazer os olhos lacrimejarem e o nariz esquentar como se pegasse fogo - não chega a ter o gosto tão ardido. Acompanha pratos fortes como a feijoada e o mocotó e acentua o visual das conservas.Pimenta-de-cheiro
A Capsicum Chinese é a espécie cultivada que possui os mais diferentes formatos e a maior variação de cores. É também chamada de pimenta-de-bode, pimenta-pitanga ou pimenta-cereja. Redondinha, menos picante que a malagueta, é ideal para temperar peixes, frutos do mar e carne de porco; e presença constante nos pratos da culinária nordestina. Em conserva dura meses.
Pimenta-da-costa
Originária da Abissínia, a atual Etiópia, chegou ao Brasil com os negros nagôs, que a chamavam de atarê. É muito requisitada por pais-de-santo, feiticeiros e ervanários - isso porque, segundo os seguidores de umbanda, é ótima para afastar pessoas indesejáveis e para assentar o santo. Na culinária também é bastante versátil. Seu fruto longo e negro pode ser mantido em conservas. Já seus grãos, menores que uma ervilha, podem ser usados inteiros ou moídos como a pimenta-do-reino. O sabor? Superardido.
Pimenta-da-jamaica
Esta pimenta, originária da Jamaica, Cuba e México, não é do gênero Capsicum. Chama-se Pimenta Officinallis. Mais suave, seu sabor delicado parece ser uma combinação entre o cravo-da-índia, a canela, a noz moscada e a pimenta. Usada inteira, é boa para aromatizar sopas e caldos; moída, é excelente para temperar peixes, frutos do mar e carnes, além de dar aroma e um toque especial aos pudins, tortas de frutas, pastéis e à bebida típica da Jamaica, o Pimiento Dram.
Autora CAMILA AMORIM
Fonte: Revista Nova
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