Havia algo de estranho e sombrio naquele homem invariavelmente vestido com uma capa preta e surrada, muito magro. Mas, ao mesmo tempo, sempre descrito como belo, elegante e extremamente fascinante. Muito bem-falante, Edgar Allan Poe devorava seus interlocutores com os olhos. E escrevia aqueles contos e poemas tão inusitados, que gelavam a espinha do leitor.
Nascido em Boston, Estados Unidos, em 19 de janeiro de 1809, era filho de atores decadentes, que morreram antes de o pequeno Edgar completar três anos. Foi então acolhido por um casal de Richmond, Virginia. O ambiente sulista, escravocata e de arcaica estrutura social, viria a ser decisivo para a sua formação: aquele cenário, no qual a presença negra era tão forte, o impressionou vivamente. No contato com suas amas e criados, Poe teve acesso às narrativas folclóricas, aos relatos sobre os cemitérios e os cadáveres que vagavam pelos pântanos da região. esta foi a base do mundo sobrenatural que ele passou a organizar em sua mente, solidificado pela leitura de revistas britânicas divulgadoras do Romantismo.
A infância de Edgar foi tranqüila e confortável, tendo estudado em ótimos colégios, inclusive no exterior. Fortes laços afetivos o uniam a Frances, sua nova mãe; entretanto, os choques violentos viriam a ser a tônica do seu relacionamento com seu protetor, John Allan: os pendores poéticos do jovem eram abominados pelo comerciante, que queria vê-lo seguindo a sua carreira, ou qualquer outra considerada "respeitável".
De 1826 a 1830, Poe tentou a Universidade e a Academia Militar de West Point. Ambas foram interrompidas um ano depois de iniciadas. O ambiente boêmio universitário seduziu o jovem Edgar, que passou a beber e a jogar. Quanto à vida na caserna, percebeu logo que não havia sido talhado para ela. Agravando a situação, John Allan se recusava obstinadamente a lhe dar dinheiro suficiente para viver como seus colegas. Nesse período, conseguiu publicar seus dois primeiros livros: Tarmelão e outros poemas e Al Aaraaf, que, mal recebidos pelo público, não lhe renderam compensações financeiras.
Diante da incompreensão que cercou sua obra, sem dinheiro ou abrigo, refugiou-se em Baltimore, em casa de Maria Clemm, sua tia pelo lado paterno. Nela encontrou tanto amor quanto lhe havia dedicado Frances, mulher de Allan, falecida há pouco.
Passou a escrever contos, gênero de maior aceitação que a poesia, e em 1833 ganhou um concurso com "Manuscrito encontrado numa garrafa". No ano seguinte, voltou a procurar John Allan, ao saber que ele estava à morte. O pai adotivo, que tinha se casado novamente, foi tomado de um ataque ao vê-lo. Morreu pouco depois, sem deixar a Edgar nada além do nome.
Apesar das adversidades, Poe casou-se no ano seguinte com Virgínia Clemm, sua prima doze anos mais nova. Obteve o emprego de redador de uma revista de Richmond, para onde se transferiu mais tarde com a mulher e a tia. Pouco depois, mudou-se novamente, dessa vez para uma cidade em que os horizontes profissionais eram mais amplos. Foi um período de sucessivas mudanças - de Nova York para Filadélfia e vice-versa, com ocasionais retornos a Baltimore e Richmond - marcado por passagens por diversas revistas literárias.
Dotado de espantosa inteligência, seu raciocínio lógico o levaria não só a elaborar intrincadas narrativas policiais, mas também a resolver um crime real, através da literatura: baseado no assassinato de Mary Cecilia Rogers, que estava denorteando a polícia de Nova York, Poe decidiu escrever "O mistério de Marie Roget" (1842) e, formulando hipóteses e deduções, deu um final ao conto que, em seguida, foi confirmado como a resolução do enigma que envolvia a morte da jovem nova-iorquina!
Sua produção arrebanhou-lhe fama e prestígio crescentes, que nem sempre lhe asseguraram o s meios de sobrevivência. Em constantes dificuldades financeiras, viu algusn de seus contos como "Os assassinatos da Rua Morgue" (1841) e o "Escaravelho de ouro" (1843) (de certo modo, pioneiros da literatura policial) serem premiados. Neste período surgiram os Contos do grotesco e do arabesco, em que deu vazão ao lado mais sinistro de seu talento.
A longa doença que acometeu Virgínia em 1842 foi um golpe dilacerante para Edgar, que, apesar disso, encontrava-se em efervescência criativa, tendo escrito nessa fase sua obra-prima: o poema O Corvo, acolhido pela crítica e pelo público com entusiasmo, e vários de seus mais famosos contos. Virgínia veio a morrer em 1847. A fase de grande produção de Poe encerrara-se pouco antes.
Nos últimos anos de sua vida, debateu-se com seus fantasmas, recorrendo ao álcool e ao ópio como remédio contra as angústias e dificuldades que o afligiam. Em 1848, na Filadélfia, Poe embriagou-se a ponto de ser encontrado sem sentidos nas ruas da cidade. Morreu a 7 de outubro daquele ano. Sua grande obra, mágica, lírica e macabra, permanece eterna.
Para quem gosta, está sendo feito agora um filme com base nas obras de Poe chamado The Raven que provavelmente deve estrear ano que vem.
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