sábado, 4 de agosto de 2012

GERDA TARO

Gerda Taro é pioneira pouco lembrada da reportagem fotográfica de guerra
Gerda Taro foi uma pioneira do jornalismo fotográfico. Nascida em 1910, em Stuttgart, ela faleceu há 75 anos, em 26 de julho de 1937. A rede de cultura alemã Deutsche Welle entrevistou Irme Schaber, cuja biografia da repórter alemã será lançada em nova edição em 2013. Ela dedicou cinco anos às pesquisas para o livro, e em 2007 foi curadora da primeira retrospectiva da obra de Taro, no International Center of Photography (ICP), em Nova York.


Deutsche Welle: Gerda Taro continua sendo pouco conhecida na Alemanha. O que havia de especial a respeito dela?


Irme Schaber, biógrafa de Taro
Irme Schaber: Como repórter na Guerra Civil Espanhola [1936-1969], ela conseguiu algumas das imagens mais dramáticas e mais frequentemente reproduzidas desse conflito. Gerda Taro foi a primeira fotógrafa a fazer fotos em meio aos combates. Essa proximidade do fato estabeleceu parâmetros para o jornalismo fotográfico de guerra e lhe custou a vida. A primeira morte durante uma reportagem de guerra despertou atenção internacional. Como mulher e como fotógrafa, ela desbravou novas terras.


Taro só atuou durante um ano na Guerra Civil Espanhola como repórter fotográfica. Que influência tem o seu trabalho, ainda assim, na história da fotografia?


Nesse breve espaço de tempo, ela desenvolveu a moderna fotografia de guerra, como a conhecemos hoje, juntamente com seu parceiro Robert Capa e com David Seymour. Todos os três procuravam estar perto da ação, munidos das novas câmeras de 35mm, facilmente transportáveis. E tomaram partido, na condição de emigrantes judeus, contra o ditador espanhol Francisco Franco e seu aliado Hitler. Essa proximidade, o risco e o engajamento permitiram ao público de milhões da imprensa ilustrada participar da guerra e da revolução. Do ponto de vista midiático e armamentista, a Guerra Civil Espanhola foi um teste prático para a Segunda Guerra Mundial.


Durante muito tempo após sua morte, Taro era considerada apenas a companheira de Capa, não sua parceira profissional. Quando foi que isso mudou?


Isso só mudou em 1994, através do meu trabalho de pesquisa e dos relatos das testemunhas da época, que pude divulgar. Quando foi lançada minha biografia de Gerda Taro, a cena fotográfica internacional reagiu bem rápido e a posicionou ao lado de Robert Capa. Afinal, as fotos dela haviam sido publicadas com destaque, na época: no magazine norte-americano Life, em jornais ingleses e franceses, revistas holandesas e suíças, etc.. Desde 2007 – quando foi encontrada na Cidade do México a assim chamada "Mala Mexicana", contendo milhares de negativos de Capa, Taro e Seymour, até então dados por perdidos – desde então sabe-se que numerosas fotos originalmente atribuídas a Capa foram tiradas por ela. No curto período no front espanhol, Taro teve êxito absoluto. Hoje, ela seria considerada uma shooting star.


A visão que se tem de Robert Capa se alterou através da pesquisa sobre Gerda Taro?


Eu diria que a imagem de Robert Capa se tornou mais diferenciada. Ele foi "o" fotógrafo de guerra do século 20. Mas não estava sozinho. Os três profissionais Taro, Capa e "Chim" Seymour marcam o início da moderna fotografia de guerra. Todos os três morreram em serviço. Taro foi a primeira, em 1937, na Espanha; Capa em 1954, na Guerra da Indochina; Chim em 1956, na Guerra do Canal de Suez. A experiência de equipe levou Capa e Chim a formar um novo coletivo de fotógrafos, a agência Magnum, que até hoje conta com prestígio internacional. A tão divulgada imagem de Capa como herói solitário não tinha muito a ver com a realidade. Mas agora a história é quase mais excitante do que antes!


Gerda Taro só viveu 26 anos. O que a biografia dela teve de especial?


Ela nasceu em 1910 em Stuttgart como Gerda Pohorylle, filha de comerciantes judeus da Galícia [na Europa Central], por isso tinha passaporte polonês. Sua infância foi marcada pelos conflitos bélicos: a Primeira Guerra Mundial começou no dia de seu quarto aniversário; ao completar 8 anos, Stuttgart sofreu ataques aéreos. Ela gozou de uma educação nobre, incluindo pensionato para moças da alta sociedade na Suíça.
Em 1929, a família se mudou para Leipzig. Lá, o fortalecimento dos nacional-socialistas resultou numa fulminante politização. Ao contrário de Stuttgart, o círculo de amizades de Taro em Leipzig era francamente politizado e provinha da burguesia judaica assimilada. Logo na primavera de 1933 – pouco após a tomada do poder pelos nacional-socialistas – foi presa por distribuir panfletos. Com sua resistência, ela reagia à polarização no país e ao fato de ser estigmatizada como judia.
Emocionante em sua biografia é o entrelaçamento entre a história mundial e a pessoal, o processo recíproco entre acontecimento político e existência privada.


Quando ela deixou a Alemanha?


Representação da morte de Gerda Taro
numa figurinha de chiclete dos EUA
No terceiro trimestre de 1933, ela foi para Paris. Lá, no exílio, conheceu o fotógrafo húngaro Endré Ernö Friedmann, e ambos se apaixonaram, logo estavam vivendo e trabalhando juntos. Gerta Pohorylle conseguiu emprego como agente fotográfica pois, ao contrário de Friedmann, falava inglês e francês fluentemente.
Foi ela que teve a ideia de adotarem esses nomes artísticos dignos de Hollywood, para se livrarem da imagem de refugiados. E assim nasceram Gerda Taro e Robert Capa. Mais ou menos simultaneamente, em fevereiro de 1936, ela conseguiu sua primeira credencial de imprensa. Poucos meses depois o casal de fotógrafos já estava noticiando diretamente da Guerra Civil Espanhola, em que tropas republicanas combatiam os soldados do fascista Franco.


Para sua biografia de Gerda Taro, você também falou com testemunhas da época. Baseada nisso, como a descreveria, como ser humano?


Interroguei muitos amigos, amigas e companheiros de trajeto. Isso foi decisivo para a biografia, pois de outro modo não teria sido possível reconstruir a história de vida de Gerda Taro. Os entrevistados a descreveram como divertida, alegre, aberta e cheia de humor. Ela tinha numerosos amigos, todos se divertiam muito, juntos. Além do mais, é descrita como uma jovem muito bonita, uma beleza casual, geralmente uma figura elegante.


Mais tarde, Robert Capa teve alguns relacionamentos, mas em geral de pouca duração. Na sua opinião, ele não superou a morte prematura de Gerda?


Robert Capa
Muitos conhecidos relataram isso. Gerda Taro foi seu grande amor, sua esposa. Após a morte dela, ele passou a considerá-la assunto privado, e nunca lhe dedicou um memorial público. Ele sofreu muito, e não queria ver o relacionamento particular exposto na mídia. Porém esta não foi a única razão por que as fotos de Taro caíram inicialmente no esquecimento. Parece-me mais importante que, logo após a Guerra Civil, começou a Segunda Guerra Mundial, a qual Capa fotografou e que suplantou tudo o mais, do ponto de vista da história da mídia.
Além disso, após a Segunda Guerra, o próprio Capa encarou dificuldades, quando nos Estados Unidos iniciou-se a caça aos comunistas liderada pelo senador Joe McCarthy. Todos os que apoiaram a Guerra Civil se tornaram alvos e durante um tempo ele esteve proibido de entrar nos EUA. Em meu livro demonstrei que, por isso, Capa instalou a posteriori uma divisão de tarefas: "Eu era o fotógrafo e Gerda, a comunista". O departamento norte-americano de investigações FBI abriu um dossiê sobre Taro ainda em 1949, 12 anos após ela ter morrido. Na época, Capa não era, em absoluto, o mito bem-sucedido, o tempo era de vicissitudes. Desse modo, Taro caiu em ostracismo. Mas também, sabidamente, pelo fato de o nome Capa proporcionar vendas mais vantajosas.

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